Hoje, dia 25 de Abril de 2008 ( feriado idóneo que merece dignidade ), foi o dia mais quente deste ano, e por isso, milhares de portugueses correram para as praias, como talvez digam mais tarde nas noticias da noite.
Na costa da Caparica, vila que acolhe mais lisboetas nas suas praias que qualquer outra, foi um clássico dia de verão, com a romaria natural que provoca um dia assim, ainda que com a brutalidade que vem das coisas repentinas.
Em uma dessas praias, a praia de S. João, o homem que foi ter com os seus amigos, teve que tirar uma vez mais a senha de parqueamento que permite entrar no caminho para a praia.
Tudo porque o terreno que antecede a beira litoral, pertence a um individuo que nem sabe o que é uma arvore ( já foi ouvido a dizer que se ardesse tudo não fazia mal, porque crescia outra vez ), e se prepara para destruir de uma forma totalmente escura, a natureza de que mais se fala e mais se procura.
A beira litoral, a mata, a praia.
"Um destes dias, abrir-se-ão os olhos para casas, muros, campos de golf, lojas."
Logo aqui, onde são populares as ameaças do mar, logo no frágil ecossistema!
O homem pensa nessas coisas, e exalta-se e comove-se, e vê abrir-se a cancela, e chega à praia de coração pesado, já mais de metade, sem saber porquê...
Mais tarde, ao sair, com a antecedência que lhe permite chegar a horas ao seu compromisso, que no caso dele até era o gozo do cinema, vê-se confrontado com uma fila mastodôntica, que o impede de sair dali na próxima hora, tempo que demorará a chegar à maldita cancela.
Ali estão, milhares de portugueses numa espera absurda, crianças a suportar um calor severo, encontros perdidos, desgaste de cidadãos que procuravam precisamente o contrário, e tudo isto por causa de um único ser que não tem ainda outra forma de fazer dinheiro com o seu terreno, se não esta, sem principios, com egoismo, sem pensar duas vezes no que anda a fazer.
Em Portugal, o que é privado é sagrado e tratado com reverência, portanto lá estão todos, a suportar a espera sem reclamação, mas cansados, cansados agora e mais tarde, mas que se há de fazer, é a vida, "queremos é sair daqui".
O homem ainda está na metade do caminho que chega à saida, mas já decidiu que é hoje, hoje logo hoje, é peciso põr ordem nisto, avançar, cobrar a razão das coisas, exigir afinal, o simples senso comum, já que a "maioria" parece não concordar com aquilo, embora apenas o expresse através das buzinas dos seus carros...
Hoje, logo hoje, a liberdade deve vencer, e resistir é um dever, um imperatativo absoluto que o homem não negará.
Não, nem pensar.
Quando chegou a sua vez de pagar, saiu do carro e declarou que não andava mais um metro, nem para a frente nem para trás, até que a policia fosse chamada ao local, para que se entendesse que autoridade prevalecia numa situação destas.
O absurdo, ou a óbvia razão das coisas.
Desta forma bloqueou a saida e foi gerada a confusão total.
Claro que ainda teve que enfrentar aqueles "que querem é sair dali", mas manteve a sua viatura em frente à cancela, mesmo depois da chegada da policia, o que obrigou a que a mesma tivesse que ser aberta e centenas de carros passassem sem pagar.( ordem do capitão da GNR )
O homem teve ainda o prazer de ver um livro de reclamações ser esgotado numa hora, e de contemplar pessoas unidas , com um desejo de mudança, que apenas precisa de um gesto anunciador, de um estimulo, de uma chama.
Várias vezes foi coagido a calar-se, pelas autoridades e pelos funcionários do local ( doentiamente convencidos, que o seu patrão é Deus ).
Várias vezes ameaçado de prisão, continuou a pregar aos peixes, sendo que alguns ainda pagavam, mesmo com a cancela aberta.
Estranho, muito estranho, inclusive para um estrangeiro, que comentava: mas como é possivel, uns pagam, outros não?!
Que vergonha, logo hoje.
O homem abandonou o local, com o sentimento de que nada será como antes, porque o que estava parado,
moveu-se e modificou-se, de uma forma gémea à dos acontecimentos mais importantes para um povo, não na dimensão, mas no seu simbolismo mais que perfeito.
Um dos guardas, ainda chamou o homem à parte, de forma educada, e quis-lhe fazer ver que ele quase lhes chamara
PIDE, ao que o homem respondeu:
Nada disso, se faz favor... mas sim, usei de demagogia, e quebrei as regras que foram feitas para quebrar.
Quando o guarda disse que não valia a pena discutir, ele retorquiu que valia.